quarta-feira, outubro 22, 2008
Atrás deles caminhava outra criança acompanhada por um homem que lhe chamava a atenção apontando para um bando de flamingos que voavam em direcção a uma língua de lodo que a maré ao vazar ia descobrindo, onde pousaram delicadamente começando logo a procurar com o bico o alimento que ali havia.
Mas a criança não ligava a nada daquilo. Ela caminhava com a insatisfação e o desejo estampados no rosto enquanto puxava pelo tecido das calças do adulto na altura do joelho. Nem os bandos de pássaros que numa algazarra de chilreios disputavam um lugar para passar a noite, nem o variado colorido dos equipamentos das muitas pessoas que no final da tarde procuravam o prazer de praticar desporto ou simplesmente caminhar entre a natureza, nem mesmo alguns cães que se perseguiam velozmente sobre a relva, distraíam a criança dos seus intentos.
Com as faces avermelhadas pela emoção e com as lágrimas a pingar do queixo ouviu-se a sua voz angustiada trazida por uma rabanada de vento que levantou as folhas acastanhadas naquele soalheiro dia de outono: "Compra-me um carrinho daqueles!!".
O adulto pegou na criança ao colo e enquanto se afastava depressa daquele local ia tentando confortá-la com expressões carinhosas e sorrisos de afectividade. Ainda era muito cedo para lhe ensinar que é o desejo de ter, exacerbado pelas sedutoras técnicas de oferta, que empobrece o ser conduzindo-o às vezes a uma dependência material acima das suas posses. "Pode ser que o pai te ofereça um no Natal".
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